quarta-feira, 12 de novembro de 2008

....e e ntão ela o viu, 15 anos depois do último encontro, em pé numa livraria, folheando algum livro com interesse e foi como se nunca tivessem se separado, ele ainda tímido, abrindo um buraco por onde se enfiar, da última vez tinha sido na areia da praia e agora ali, mergulhando dentro de um livro e nada a impediu nem ela pensou, foi direto dizendo “você aqui, achei que tinha morrido” e ele disse “morrer e morar em Campos dá no mesmo” e então ela riu como ele gostava e ela o achou igualzinho mas a cabeça dele continuava boa e ruim; boa para lhe convidar para um café e ruim porque continuava negativo pois começou dizendo “estou muito velho”, justo ele que estava moreno e forte como um índio e ela perguntou porque só agora ele voltava para a cidade que tanto detestava, e ele disse que tinha acabado de saldar as dívidas,terminado um casamento e fechado a casa, mas não tinha idéia do que fazer agora e aonde ir, então ela pensou: ele foi lá arrumar a toca,ele mudou, mas, de repente, não sabe se foi porque ele apertava os olhos diante dos ruídos em volta, como um raio o mesmo sentimento da última vez há quase vinte anos lhe abateu, ele não quer ajuda, ele tem esta vida de roedor, se esconde do sol, rasga tudo o que vê ali naquela toca e quando o abrigo cai em sua cabeça ela pensa em sair, mas apenas quando o sapato já encheu tanto de areia que não dá para andar quase e quando ela pensou nisto, de repente o café estava se estendendo e o perigo morava ali, na porta da nova caverna que ele se animava a re-começar com ela, definitivamente ele era um bicho, um índio deprimido, um negro com banzo que nunca quis se civilizar e por mais idiota que ela achasse ter um computador, passar creme, fazer compras ou falar com os outros, as pessoas iam sobrevivendo assim então ela os imitava, mas ao mesmo tempo achou tão lindo ele estar igual que fechou os olhos, respirou fundo, disse “até daqui a outros 15 anos” e, cheia de instinto de preservação, lhe deu um beijo e partiu.
AiAi & Os Outros
Exercício: texto com um ponto só

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